Laboratório da Coppe desenvolverá combustível “verde” para a aviação

Prof. Fábio Toniolo

A Coppe/UFRJ, a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) e a Petrogal assinaram, em março, um contrato para o desenvolvimento de combustível de aviação sustentável (SAF, sustainable aviation fuel), resultante da reação entre gás carbônico (CO2) e hidrogênio pela ação de catalisadores, sendo uma alternativa renovável ao querosene de aviação. O projeto será desenvolvido pelo Núcleo de Catálise (Nucat) e no Centro de Pesquisas e Caracterização de Petróleo e Combustíveis (CoppeComb) da Coppe, sob coordenação do professor do Programa de Engenharia Química (PEQ), Fabio Toniolo.

 Conforme explica o professor da Coppe, é um desafio conseguir utilizar o dióxido de carbono como uma matéria prima para a indústria. “O CO2 é uma fonte de carbono e nosso objetivo nesse projeto é transformá-lo em combustível. Podemos fazer isso por rotas catalíticas, obtendo inclusive combustível para aviação, que é o interesse da Petrogal.” 

 Segundo Toniolo, a equipe de pesquisadores do NUCAT (que inclui mestrandos, doutorandos e pós-docs) usará dióxido de carbono junto com hidrogênio verde, obtido a partir de fontes renováveis, iniciando, então, um processo catalítico, gerando, primeiramente, etanol, e continuando o processo para o desenvolvimento de moléculas maiores e mais complexas que compõem o pool do combustível de aviação.

 “Ao final, entregaremos à empresa um protótipo, capaz de produzir um combustível que atenda a todas as especificações internacionais. Será um combustível drop in com propriedades semelhantes ao querosene de aviação de origem fóssil, e assim, não será necessário mudar o motor e nem a cadeia logística”, esclarece.

 De acordo com o professor, a rota tecnológica a ser seguida é a ATJ (alcohol to jet fuel). “Uma rota complexa, com várias etapas, sendo a primeira a desidratação do etanol e sua conversão em etileno, que será oligomerizado para crescimento da cadeia de carbono até a faixa de hidrocarbonetos mais complexos. Depois, hidrogenação e isomerização para alcançar moléculas semelhantes àquelas do querosene de origem fóssil”.

 Conforme ensina Fabio Toniolo, outra rota interessante para produção de combustíveis sintéticos também estudada no Nucat, é a Síntese de Fischer-Tropsch, que gera uma gama de produtos.  “É uma reação bem conhecida, mas muito utilizada a partir do gás de síntese, hidrogênio e monóxido de carbono. Para partimos do CO2 como matéria-prima, precisamos aprimorar o catalisador para fazer a dissociação do dióxido de carbono em monóxido e a reação segue como uma Fischer-Tropsch comum. Precisamos controlar as condições de reação para maximizar a obtenção do produto que queremos; este é um desafio constante na área de Catálise. No Nucat, buscamos, entre outras coisas, entender a viabilidade de transformar o etanol em hidrogênio, mas também transformá-lo em álcoois e hidrocarbonetos mais complexos, que são produtos químicos de maior valor agregado utilizados em outros ramos da indústria”.

 Serão construídos dois protótipos, um em escala de bancada no Nucat, e outro, em escala maior, no CoppeComb. “No Nucat desenvolveremos os catalisadores em quantidades pequenas, em nível de bancada, para realização de testes em inúmeras e diferentes condições experimentais, com cromatógrafos ligados em linha para possibilitar uma avaliação rápida dos catalisadores desenvolvidos para o projeto”, explica Toniolo.

 “Uma vez encontrados os melhores catalisadores e otimizadas as condições de reação como temperatura, pressão e vazão, partiremos para a etapa de construção do protótipo, que ficará no CoppeComb, e que produzirá uma quantidade relevante, primeiro de etanol e depois de combustível de aviação. Os combustíveis produzidos no CoppeComb serão fundamentais para caracterizarmos as várias propriedades que garantem a sua aplicação como combustível conforme as normas internacionais vigentes”, complementa o professor da Coppe.

Repensando o futuro do etanol

De acordo com a Associação Internacional do Transporte Aéreo (Iata), a aviação civil foi responsável por 2% de todo o carbono emitido no planeta, no ano passado. O uso de Combustível Sustentável de Aviação (SAF), feito a partir de matérias-primas renováveis, pode evitar pelo menos 75% das emissões totais de CO2 do ciclo de vida em comparação com o combustível fóssil de aviação.

Segundo o professor do Programa de Engenharia Química, o etanol por si só já é um combustível de interesse. “Hoje no Brasil prevalece o etanol vindo da cana de açúcar, mas a ciência avança no desenvolvimento de processos que fornecerão etanol a partir de CO2. Penso que em alguns anos, quando esta nova rota estiver mais madura tecnologicamente, com maior ganho de escala, ela competirá com o etanol produzido a partir da cana. O setor sucroalcooleiro deveria pensar, que em alguns anos terá a concorrência do etanol vindo do CO2”.

“O Brasil é um grande produtor de etanol. Seria importante não olharmos para este composto químico apenas como combustível a ser queimado em um motor, mas sim como matéria-prima para produtos de alto valor agregado. A indústria brasileira deve investir em iniciativas tecnológicas e se preparar para as mudanças que virão nas próximas décadas. Podemos fazer muito com a catálise e com a engenharia e podemos produzir muito utilizando processos e reatores operados de forma contínua em vez de batelada. Na indústria, os processos contínuos são desejáveis”, acrescenta Fabio Toniolo.

O projeto se soma às iniciativas da Embrapii alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030, como o ODS 12 (Consumo e produção responsáveis) e ODS 7 (Energia limpa e acessível). Atualmente, 67% dos projetos da Embrapii de inovação estão em sintonia com os ODS.

O investimento total previsto para o projeto supera 21 milhões de reais. A parcela destes recursos que será aplicada pela Embrapii faz parte do programa Inova+ BNDES, uma parceria com o banco para apoiar projetos que desenvolvam soluções em novos combustíveis e em outras áreas como bioeconomia florestal, economia circular, transformação digital, saúde, materiais avançados e defesa. A iniciativa atende empresas de todos os portes, incluindo pequenas, médias (PMEs) e startups.

Fonte: Planeta Coppe 

Publicado em - 03/05/2023